Bandeira anticorrupção de Bolsonaro caiu. Agora, terá que encontrar outro slogan

Publicado por: Editor Feed News
24/11/2020 13:39:18
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A Lava Jato levou à condenação de políticos, enquanto a eleição de Jair Bolsonaro colocou no poder um político que prometeu erradicar a corrupção e que para seu ministro da Justiça nomeou o juiz anticorrupção que liderou a investigação.

 

Dois anos depois, o ministro da Justiça Sérgio Moro está fora do Governo e o Presidente, que está a ser investigado pelo Supremo Tribunal por suposta má conduta, declara que a prevaricação pública não é mais um problema, como notou o jornalista Terrence McCoy, num artigo publicado no Washington Post.

 

“Eu não quero acabar com a Lava Jato, eu acabei com a Lava Jato”, disse Bolsonaro em outubro, pouco antes de um dos seus principais aliados no Congresso ser encontrado com notas de dinheiro nas cuecas. “Não há mais corrupção no governo”, sublinhou na altura.

 

A lacuna entre a promessa de Bolsonaro e a realidade foi acentuada este mês, quando o filho do Presidente, o senador Flávio, foi acusado de peculato e lavagem de dinheiro. Promotores do Rio de Janeiro alegam que este usou dinheiro público para pagar assessores legislativos quando atuou na Assembleia do Estado. Outro filho, o vereador Carlos, foi acusado pelos mesmos crimes.

 

“Infelizmente, nesta presidência, a agenda anticorrupção foi abandonada”, disse Moro ao Washington Post. “Este foi um dos principais motivos que me levaram a sair”, frisou.

 

Num país onde a questão da corrupção raramente foi a principal preocupação, com a atenção voltada para o coronavírus – que vitimou cerca de 170 mil brasileiros e infetou mais de 6 milhões – o tema recuou no debate público, lê-se no artigo.

 

“Temíamos que haveria contratempos”, disse Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil. “O que estamos a ver é a confirmação do que temíamos, não só avanços fracos, mas retrocessos muito graves. É muito preocupante e dececionante”, referiu.

 

 

Senado Federal / Flickr

O senador Flávio Bolsonaro, filho do Presidente brasileiro Jair Bolsonaro

 

Durante a campanha presidencial de 2018, Bolsonaro apresentou uma posição ímpar para livrar o país da corrupção, lembrou Terrence McCoy no artigo.

 

Contudo, a corrupção nunca foi o centro da sua mensagem política, tendo estado mais voltado para a ditadura militar do Brasil, ofendendo-se com as políticas sociais de esquerda e fazendo comentários que chocaram e ofenderam. Mas, à medida que a campanha evoluía, investiu numa mensagem para acabar com a corrupção – e encontrou um público.

 

“Os males e os danos da corrupção afetam a população em todos os sentidos”, declarou o chefe de Estado antes da eleição. “Isso é o que queremos parar. Um governo corrupto estimula o crime em todas as áreas”, reforçou.

 

Depois da vitória, quando escolheu Moro para ministro da Justiça, os brasileiros viram nessa decisão a prova de que falava sério. Os “lavajatistas” – cidadãos mais ávidos por acabar com a corrupção – formavam um dos maiores segmentos da sua base política.

 

Bolsonaro “tinha a bandeira anticorrupção, mesmo não sendo um político anticorrupção”, explicou Alexandre Bandeira, analista político em Brasília. “Era a política certa, no momento certo”.

 

Quando Moro renunciou, em abril, acusou Bolsonaro de má conduta, indicando que o Presidente tentou substituir um chefe de polícia no Rio de Janeiro para bloquear as investigações sobre a sua família e amigos, alegações que estão a ser investigadas pelo Supremo Tribunal.

 

Moro, considerado um dos principais adversários do atual Presidente nas eleições de 2022, disse que quando assumiu o cargo, reconhecia os esforços anticorrupção como “essenciais, dada a história recente do Brasil”. Mas Bolsonaro “deu um mau exemplo, não apenas através do seu discurso, mas também através das suas ações”, acrescentou.

 

Câmara Rio / Flickr

Carlos Bolsonaro, filho do Presidente brasileiro Jair Bolsonaro

 

Pesquisas recentes mostraram que o comportamento de Bolsonaro durante a pandemia teve um preço político, com muitos dos candidatos que o Presidente apoiou nas eleições municipais desta semana a perderem.

 

Porém, os seus índices de aprovação aumentaram nos últimos meses, impulsionados pela popularidade crescente entre os mais desfavorecidos. Mas o país, destacou Terrence McCoy, que tem injetado dinheiro nos bolsos dos mais pobres para compensar a queda económica do coronavírus, não pagará o benefício indefinidamente.

 

Esther Solano, socióloga da Universidade Federal de São Paulo que passou anos a entrevistar apoiantes de Bolsonaro, indicou que os escândalos de corrupção não abalam o apoio dos mais fiéis, que o vêem como uma vítima de perseguição política.

 

Esses apoiantes podem também “relativizar” os escândalos, apontou Nara Pavão, cientista política da Universidade Federal de Pernambuco. “Muitas pessoas vão pensar: ‘O que ele [Bolsonaro] está a fazer não é nada comparado ao que o último governo fez’. Temos muitas evidências empíricas disso”, sublinhou.

 

Mas as reações podem ser diferentes entre os seus seguidores mais moderados, que inicialmente apoiaram Bolsonaro não por ideologia, mas porque este prometeu abordar as questões mais urgentes do país, acrescentou Solano.

 

“Para os mais moderados, essas alegações de corrupção estão a receber atenção e estão a ter um impacto negativo na imagem de Bolsonaro. Os eleitores de classe média estão muito decepcionados com a saída de Sérgio Moro”, concluiu.

 

Para os analistas, continuou Terrence McCoy no artigo, está cada vez mais claro que a plataforma que funcionou para Bolsonaro em 2018 não estará disponível na próxima campanha presidencial em 2022. Incapaz de se posicionar como um agente anticorrupção, precisará encontrar uma nova base de apoio – talvez entre os mais necessitados, se conseguir encontrar uma maneira de continuar ou ampliar a rede de segurança social.

 

Fonte: Planeta ZAP //

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