Sistema de encarceramento no Brasil é criticado durante debate na Esdep

Publicado por: Editor Feed News
18/02/2017 14:17:53
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Evento reuniu diversos atores do sistema judiciário e da administração penal na noite dessa sexta-feira, 17
 

O Brasil é o sexto colocado no mundo em número de presos a cada 100 mil habitantes. É o quarto maior no ranking de população prisional. Há um déficit de 250 mil vagas no sistema penitenciário. Apenas como presos provisórios, por exemplo, estão mais de 249 mil pessoas. Na Bahia, 87% da população carcerária é negra. Esses dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) foram apresentados pelo subdefensor geral do Estado da Bahia, Rafson Ximenes, durante a abertura do debate sobre o Encarceramento no Brasil e suas possíveis alternativas, nesse sexta-feira, 17. O evento aconteceu na Escola Superior da Defensoria Pública da Bahia - Esdep e reuniu diversos atores do sistema judiciário e da administração penal. Foi também transmitido para as 29 comarcas onde a Defensoria está presente por meio da videoconferência.

 

"Qual é o objetivo de uma política de segurança pública?", propôs Rafson Ximenes a reflexão ao público presente antes de iniciar o debate. "Uma política de segurança pública tem que se voltar para a redução da violência e não para o encarceramento. A partir dessa resposta é que podemos começar a discutir o tema e para discuti-lo é preciso conhecer também a realidade do sistema carcerário", complementou. A Defensoria Pública baiana analisou autos de prisão em flagrante de 2016 em Salvador, em uma amostra de 4.981 documentos, chegando à conclusão de que 99,20% das pessoas presas nessa condição são negras. "Há, sim, uma política que tem como resultado a prisão em massa da população negra", declarou. Em contrapartida, conforme dados do Infopen apresentados pelo subdefensor-geral, os tipos penais considerados mais graves (homicídio, latrocínio e estupro) correspondem cada a menos de 1% dos crimes cometidos pelas pessoas que estão presas. "Quando falamos de prisão, de pessoa em situação de prisão, de persecução penal, não estamos falando de pessoa enquadrada em situação de violência. Não é essa a regra. Pelo contrário, essa é a exceção", ponderou Rafson Ximenes.

VISÃO

Rafson Ximenes definiu como "causa-mãe" do problema no sistema de encarceramento no Brasil a visão maniqueísta de guerra entre o bem e o mal, como se existisse o lado das pessoas bem-intencionadas combatendo os vilões. "O mundo do crime é o nosso mundo. O crime está aqui. Não tem essa distinção. Mas se não percebemos isso, se tivermos a visão de que é uma guerra do bem contra o mal, perdemos a sensibilidade, a capacidade de se colocar no lugar do outro e perdemos a capacidade de respeitar as próprias regras", disse, ao destacar também como causa para o encarceramento a política de guerra às drogas.

 

Corroborando o pensamento do defensor público, o promotor de Justiça do Ministério público e pesquisador, Elmir Duclerc Ramalho Junior, alertou que a política criminal de drogas é que dá o "tom" da política criminal. Para ele, é preciso observar como o sistema penal criminaliza não determinada conduta, mas determinadas pessoas. "Aqueles que estão lá são as pessoas vulneráveis", sentenciou.

 

O juiz de Direito Icaro Almeida Mota, também um dos debatedores, falou sobre a redefinição do papel dos atores da justiça criminal para que estes se atentem às garantias de um processo penal democrático. Na sua área de atuação, enquanto magistrado, ele citou alguns exemplos de práticas que podem ser adotadas para essas garantias de direitos, como não participar nem decretar medidas de restrição de liberdade na fase de investigação e não produzir provas. "O juiz não está ali para resolver o problema da política pública. Está ali para julgar de acordo com o que lhe vier posto e de acordo com esse respeito aos direitos e garantias fundamentais", ressaltou.

 

O major da Polícia Militar e superintendente de Gestão Prisional da Secretaria de Administração Penitenciária, Julio Cesar, apresentou o papel da SEAP e destacou o compromisso da pasta em fortalecer a ressocialização do interno e dos egressos do sistema prisional. Para o major, essa medida figura entre uma das possibilidades para diminuição do número de pessoas privadas de liberdade. De acordo com o major PM Júlio Cesar, na Bahia, diferente do que acontece no Brasil como um todo, há uma estagnação da população carcerária desde 2011. "Ampliamos efetivamente a oferta de vagas, sem ampliar de forma considerável o número de pessoas privadas de liberdade", afirmou.

 

ALTERNATIVAS

 

Para a ouvidora da Defensoria Pública e socióloga, Vilma Reis, ações como implantar corregedorias e ouvidorias externas na Polícia são algumas das possibilidades para melhoria do sistema carcerário no Brasil. "Você não dá o peixe para o gato tomar conta", criticou. Ela ainda apontou fazer investimentos na Defensoria Pública como caminhos para promoção de direitos. "O inacreditável é contratar um advogado dativo para fazer um júri e este ganhar 21 mil reais". A Defensoria Pública está presente em 29 comarcas, o que representa pouco mais de 10% das comarcas existentes.

 

Entre as propostas apresentadas pelo subdefensor geral, Rafson Ximenes, estão uma discussão sérias sobre a descriminalização das drogas, respeito à excepcionalidade da prisão provisória, investimento na Defensoria Pública e disputa do senso comum. Para o promotor de Justiça Elmir Duclerc Ramalho Junior, essa disputa do senso comum também é uma das alternativas para melhorar o modelo vigorante no sistema prisional. "As agências de reprodução ideológica, que é a academia, é a faculdade, são algo como a Escola Superior da Defensoria Pública, onde produzimos o conhecimento que vai ser utilizado por todas as outras agências, são o espaço político de atuação que acalentam a utopia de uma sociedade justa, livre e solidária", considerou ao destacar como importante a matéria "Criminologia" (disciplina que se debruça sobre como o crime acontece) ter sido cobrada aos candidatos que prestaram o concurso público para carreira da Defensoria baiana.

 

Por Luana Rios

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